Por que não consigo mudar?
- Luiza Natale
- 24 de fev.
- 6 min de leitura
Atualizado: 7 de mar.
Você já tentou levar alguém a mudar algo, como parar de fumar ou de beber, só para se frustrar com a resistência da pessoa? Ou quis mudar o próprio comportamento e falhou? Você já se questionou "Como mudar"?

Quando precisamos passar por alguma mudança ou estimular alguém a mudar, isso envolve algumas etapas que, se não as considerarmos adequadamente, podemos dar um passo maior que a perna e nos desestimular logo.
Veja neste artigo que etapas são essas e como identificá-las para aumentar sua chance de alcançar uma mudança duradoura.
Faz sentido mudar?
Concorda comigo que uma pessoa não vai parar de fumar ou de beber se tal restrição não fizer sentido para ela? "Para que vou parar de beber se isso me faz feliz? Não é isso que vai me matar!"
E quando tentamos estimular essa pessoa a parar de beber, fazendo-a ir a médicos, fazer tratamentos e brigando com ela, estamos nadando contra a correnteza, pois estamos tentando fazer essa pessoa agir para mudar quando ela ainda está em outra etapa da mudança.
Modelo transteórico da mudança

Este modelo consolidou-se como uma forma de descrever e identificar diferentes etapas comuns na maioria dos processos de mudança de comportamento. Assim, ele oferece uma estrutura não só para compreender, mas também para identificar e intervir diante de uma situação, aumentando as chances de consolidar uma mudança.
Tal modelo considera a consciência e intencionalidade da pessoa quanto à mudança proposta. Assim, aponta-se as seguintes etapas:
Pré-contemplação
Contemplação
Preparação
Ação
Manutenção

A pré-contemplação é o estágio em que a pessoa não tem interesse em mudar e nem percebe determinado comportamento como um problema ("Vou continuar comendo doce toda hora sim, minha diabetes não é um problema, está controlada")
Também é o caso apontado anteriormente da pessoa que bebe demais: "Para que vou parar de beber se isso me faz feliz? Não é isso que vai me matar!"

Já a contemplação envolve o desejo de mudar, mas nesse momento a pessoa ainda enxerga e aponta muitas barreiras para justificar a falta de mudança ("Quero parar de comer doce, mas tenho muito estresse na minha vida e preciso do açúcar para suportar")

Quando a pessoa chega na etapa de preparação, ela está disposta a fazer algo para mudar, de forma que começa a planejar formas de efetivar uma mudança dentro dos próximos 30 dias. ("Vou procurar uma nutricionista semana que vem para adequar minha alimentação e reduzir os doces")

Na fase da ação, a pessoa já está implementando alguma ação para mudar, dando algum passo para alterar o comportamento. ("Já tirei todos doces de casa")
Quando a pessoa mantem as mudanças da etapa anterior por mais de 6 meses, dizemos então que chegou à etapa de manutenção. Neste momento, a pessoa sustenta a mudança em sua vida ("Estou seguindo as orientações da nutricionista quanto ao doce desde o ano passado").
Estas etapas não são necessariamente lineares, podendo ter idas e vindas. A pessoa pode ter começado a etapa de ação e, então, logo mais retornar à contemplação, por exemplo.
Então note que se você tenta convencer um familiar muito querido a parar de fumar, por exemplo, mas ele ainda está na fase de pré-contemplação, suas chances são extremamente baixas de ter sucesso se sua estratégia for exigir mudança (etapa da ação). Ou seja, se a pessoa está na pré-contemplação, a estratégia tem que ser focada em ajudar seu familiar a perceber racional e emocionalmente o quanto aquilo pode ser um problema para ela.
PROCESSOS DE MUDANÇA
Ao identificar em que etapa estamos diante da mudança de um determinado comportamento, conseguimos entender e definir uma estratégia mais útil e eficaz para lidar com a situação.
Assim, podemos considerar alguns fatores que nos ajudam a começar a mudar algo, considerando a etapa em que a pessoa está e os âmbitos cognitivo e comportamental.
Pré-contemplação, contemplação e preparação

Quando estamos na fase de pré-contemplação, contemplação e preparação, precisamos focar mais em fatores cognitivos para facilitar a evolução nesses estágios.
Aumento da consciência: Conscientização sobre o comportamento e necessidade de mudança.
"Será mesmo que comer doce não pode tirar minha Diabetes do controle? Talvez eu esteja comendo doces em excesso, meus exames de glicose têm subido. Se eu continuar assim, posso ter sérias complicações com o diabetes e piorar minha saúde."
Alívio emocional: Experimentar e expressar sentimentos sobre o problema e sua solução. Trabalhar no fator emocional pode realçar/aumentar o valor do novo comportamento, assim como diminuir a força da necessidade do comportamento atual. Ajuda a ampliar a consciência e na reavaliação.
"Gosto de comer doces porque sinto prazer e fico bem por um tempo. Mas, ao mesmo tempo, fico triste e ansioso quando vejo meus níveis de glicose subindo."
Autoreavaliação: Reavaliar o comportamento e visualizar o tipo de pessoa que quer ser após serem feitas as mudanças positivas, bem como a forma como o comportamento atual conflitua com valores pessoais e objetivos de vida. Ou seja, considerar como os comportamentos atuais e/ou os novos comportamentos se ajustam às aspirações da pessoa.
"Quero ser alguém que cuida do próprio corpo, que tem disciplina e consegue fazer escolhas alimentares saudáveis. Quero ser uma pessoa que controla sua saúde, não alguém que é controlado pela comida. Minha saúde e a longevidade são valores muito importante para mim."
Reavaliação do ambiente: Avaliar a forma como o problema afeta o ambiente ao seu redor. Isto é, como o comportamento atual é ou não é útil ou proveitoso no ambiente/contexto em que vive.
"Quando visito familiares e amigos, a reunião gira em torno de comer. É algo que cria e estimula a nossa conexão."
Deliberação social: Identificar e criar alternativas e oportunidades no ambiente/meio social que estimulem a mudança, bem como perceber as que facilitam que mantenha-se como está.
"Posso falar com minha família e pedir para eles me ajudarem nas escolhas alimentares. Também gostaria de encontrar um grupo de pessoas que estão tentando controlar o consumo de doces, assim eu me sentiria compreendido e não me sentiria tão sozinho."
Ação ou manutenção

Quando estamos na fase de ação ou manutenção, é importante focar nos fatores comportamentais para facilitar a evolução nesses estágios.
Autodeliberação: Estabelecer compromisso com a ação, decisão de mudar padrões de comportamento em busca de um novo hábito.
"A partir de hoje, vou controlar meu consumo de doces. Sei que será muito difícil, mas estou comprometido a cuidar da minha saúde. Vou criar um plano e farei o necessário para seguir ele, sem desculpas."
Controle de estímulos: Evitar ou combater os estímulos tentadores que estimulam os problemas de comportamento. E não só evitando estímulos que contribuam para o comportamento indesejado, mas também mudando e criando estímulos que auxiliem o comportamento desejado.
"Vou parar de comprar doces e garantir que não tenha nenhum tipo de tentação em casa. Em vez disso, vou manter frutas frescas e snacks saudáveis na geladeira para ter algo rápido e gostoso quando der vontade de beliscar."
Condicionamento contrário: Criar alternativas substitutas para o comportamento-problema, fazendo novas conexões entre determinados estímulos e os comportamentos por ele provocados.
"Quando a vontade de comer um doce surgir, vou comer uma fruta ou um pedaço de chocolate amargo. Isso me dará uma sensação de prazer, mas sem prejudicar minha saúde. Com o tempo, vou associar esse comportamento ao prazer em vez de doces carregados de açúcar."
Administração de contingências: Entender, criar e mudar as contingências do ambiente que reforçam o comportamento. Ou seja, recompensar a si próprio ou ser recompensado pelos outros quando realiza as mudanças.
"Cada vez que eu resistir à tentação de comer doces e seguir minha alimentação saudável durante a semana, vou me recompensar com algo que me faça bem, como um fim de semana relaxante ou comprar um item que eu queira. Isso vai me motivar a continuar firme."
Relacionamentos de auxílio: Buscar e aceitar auxílio e suporte social, sendo um elemento muito importante para iniciar, modificar e parar comportamentos.
"Vou falar com minha esposa e meus amigos sobre minha decisão de parar de comer doces e pedir que me ajudem a manter o foco."

Estes processos são mecanismos que nos ajudam a pensar estratégias para avançar no processo de mudança, seja para ajudar e incentivar outras pessoas a mudarem ou para nós mesmos mudarmos algum comportamento nosso.
Portanto, cada estágio de motivação envolve tarefas específicas e importantes de se fazer consistentemente para avançar para as próximas etapas, promovendo um processo de mudança mais duradouro e bem-sucedido no estabelecimento de um novo comportamento.
Precisando, estou aqui <3
Luiza Teixeira Natale
Psicóloga clínica
CRP 05/77673
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