Estamos lidando com o problema certo?
- Luiza Natale
- 18 de set. de 2024
- 5 min de leitura
Atualizado: 7 de mar.
Recontextualize para solucionar problemas certos
Você já notou que o modo como percebemos nossos problemas pode ser a diferença entre emperrar em um problema e de fato conseguir resolvê-lo?

Isso é o que Thomas Wedell-Wedellsborg, autor do livro "Qual é o seu problema?", defende com a ideia de recontextualização de problemas. Ele propõe que, muitas vezes, ficamos presos tentando resolver problemas da forma errada simplesmente porque não paramos para entender se estamos, de fato, encarando o problema certo.
Agora, pensa comigo: e se a gente aplicasse essa abordagem em nossas vidas nas questões emocionais, comportamentais e psicológicas? Aí que entra a mágica. Recontextualize para solucionar problemas certos e veja a mudança acontecer. Vamos explorar como essa ideia pode transformar a maneira como lidamos com nossos desafios.
O que é recontextualizar problemas?

Wedell-Wedellsborg defende que, em vez de aceitar automaticamente nossa primeira compreensão do problema e pular direto para a solução, precisamos investir mais tempo em entender melhor o problema. Muitas vezes, a maneira como o definimos e o formulamos pode não ser a mais precisa ou a mais útil para o que precisamos.
Pense em uma empresa que está recebendo muitas reclamações de seus clientes quanto à demora na fila de espera. O gerente quebra a cabeça tentando identificar como tornar o processo de atendimento mais rápido, contudo as opções para agilizar também fariam o atendimento piorar. Talvez uma maneira de formular melhor a situação poderia ser "como tornar a espera mais agradável". Assim pode-se encontrar uma solução em que o cliente não se incomoda com a espera e, ainda, quando chegar sua vez terá o melhor atendimento, já que não haverá prejuízos no processo de atendimento.
A grande sacada é questionar o que realmente está acontecendo e se há outras perspectivas possíveis sobre a situação em que o desafio ocorre, o que pode gerar uma solução mais eficaz. E essa ideia tem uma baita conexão com a psicologia!
Recontextualizando problemas em psicologia

Na Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC), um dos elementos mais poderosos é a reestruturação cognitiva, em que a pessoa desenvolve pensamentos mais alinhados com suas necessidades e objetivos de vida, o que envolve mudar a perspectiva - inclusive sobre os problemas.
Um paciente pode chegar ao consultório com sintomas de TOC e acreditar que precisa checar várias vezes se fechou o portão de casa, se desligou o fogão, entre outras checagens. Ao longo das sessões, contudo, ele pode perceber que o problema não é sobre as coisas estarem ou não fechadas ou de determinada forma, mas sim a impossibilidade de ter o controle sobre as incertezas na vida. Trabalhar para conseguir lidar com as emoções incômodas geradas pela incerteza pode ser mais produtivo do que continuar os comportamentos compulsivos que geram alívio apenas momentâneo.
Imagine agora um paciente bariátrico que está se preparando para a cirurgia. Ele pode chegar dizendo que o problema é que ele sente muita fome e seu corpo precisa mesmo de grandes quantias de comida para sobreviver. Mas, e se o problema não for exatamente esse? E se, ao investigarmos melhor, descobrirmos que a verdadeira questão não é sentir fome e sim sentir necessidade de prazer? Em vez de pensar em 'como não sentir fome' talvez possa ser mais produtivo pensar em 'como encontrar prazer em outras fontes mais benéficas'.
Tal caminho pode ser potencializado ao trabalhar a crença por trás da fome, diferenciando o que é fome de fato (sensação fisiológica que indica que o organismo necessita de reposição nutricional) e o que é vontade de comer.
Assim como Wedell-Wedellsborg sugere, reformular o problema pode ser a chave. O paciente, em vez de se perguntar "como vou lidar com a ansiedade por não poder comer o que gosto?", pode ser guiado a pensar "como posso manter o prazer de comer de forma saudável e ainda alcançar meus objetivos?". Isso muda tudo, né?
Psicologia cognitiva e a recontextualização
A psicologia, especialmente a TCC, já trabalha há muito tempo com a ideia de que a forma como interpretamos nossos problemas pode definir o sucesso ou fracasso na resolução deles. A TCC ensina os pacientes a desafiar suas interpretações automáticas dos eventos, reavaliando o que pensam e sentem.

Por exemplo, alguém que se sente constantemente rejeitado pode estar interpretando de forma distorcida as interações sociais. O trabalho do terapeuta é ajudar essa pessoa a reformular o problema, enxergando que talvez a rejeição pode não ser tão frequente quanto ela imagina – e, quando acontece, pode não ser tão pessoal quanto parece. Ou, no caso de todos indícios apontarem para a veracidade de certo pensamento, considerar diferentes perspectivas de como lidar com o problema.
Essa abordagem vai ao encontro do que Wedell-Wedellsborg propõe: dê um passo atrás e considere se realmente a sua suposição inicial faz sentido e se há outras perspectivas que possam ser mais úteis e eficazes para seu problema.
Executar soluções baseadas em suposições erradas pode levar a grande custo de energia, dinheiro e motivação. Por isso, podemos aplicar essa estratégia desde o início em qualquer desafio que enfrentarmos.
Como?
Desafie seus pensamentos. Quando, diante de um problema, surgir um pensamento sobre o que causou aquele problema, veja se esse pensamento faz sentido antes de aceitá-lo como verdade. Dê um passo atrás e veja se há outra forma de ver a situação, tem certeza de que o problema é exatamente como você pensou? Ou, diante daquela situação, pode ser que o problema seja um pouco diferente ou haja outros fatores que ainda não considerou?
Aplicando no cotidiano
Quer ver como isso funciona no dia a dia?

Vamos supor que você tenha um problema constante com prazos no trabalho, sempre sentindo que está atrasado. A primeira reação pode ser tentar gerenciar melhor o tempo, fazer listas e colocar alarmes.
Mas, e se o verdadeiro problema for sua dificuldade em dizer "não" e priorizar o que realmente importa? Mudar a forma como você vê o problema – de “gestão de tempo” para “gestão de prioridades e limites” – pode te levar a uma solução completamente diferente e muito mais eficiente.
E o melhor é que isso pode ser aplicado em praticamente qualquer contexto: relacionamentos, questões de autoestima, transtornos de ansiedade, entre outros.
Conclusão
O que Thomas Wedell-Wedellsborg nos ensina em "Qual é o seu problema?" é que, às vezes, estamos tentando resolver o problema errado. E isso é uma lição valiosa que podemos aplicar tanto na área profissional quanto em nossa vida pessoal, nos relacionamentos com os outros e em questões particulares.

Aprender a recontextualizar problemas é, sem dúvida, uma habilidade que pode transformar a maneira como enxergamos nossas dificuldades e, mais importante, como as superamos.
Então, da próxima vez que se deparar com um desafio, pare e pergunte-se: Estou resolvendo o problema certo? Essa pequena mudança de perspectiva pode ser o início de uma grande solução!
Precisando, estou aqui <3
Luiza Teixeira Natale
Psicóloga clínica
CRP 05/77673
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